23/08/2017 | Autor: Mylene Abud
O assunto pode ser espinhoso, mas falar sobre sucessão, nos dias de hoje, é fundamental. No primeiro artigo da série, vimos um panorama geral da questão que, se bem estruturada, pode trazer benefícios tanto para o criador do negócio como para o herdeiro.
Nossa segunda reportagem fala sobre a complexidade do processo, dominado inicialmente por questões jurídicas e fiscais, descuidando da questão central, que é a psicologia familiar. Se o dono do negócio está na faixa dos 50 a 60 anos e ainda se sente jovem e ativo, como pode pensar em desacelerar o passo e trocar sua função de executivo para o posto de conselheiro? E como seus filhos, já formados ou na reta final da faculdade, e que estão na linha sucessória, lidam com essa situação?
Para o consultor e pesquisador Francisco Vila, o jovem, seja ele filho ou filha, está com um dilema tridimensional. “Do ponto de vista individual de um filho, temos que ponderar três óticas de negócio. A primeira, é a atividade rural como ela está com o patriarca, em uma determinada dimensão e nível tecnológico de produção, e com o conjunto da família como ela se encontra. A segunda ótica antecipa o formato futuro quando o modelo patriarcal se transformará em uma sociedade de familiares, na qual um ou vários sucessores passam a ser empregados dos outros associados familiares que não estão envolvidos no dia a dia da gestão. E, por fim, cada pessoa imagina seu próprio negócio da gestão material e ideal dos seus talentos ao longo da sua vida e no contexto da família que já fundou ou pretende construir no futuro”, explica.
Desta forma, observa Vila, a decisão para cada filho/herdeiro sobre o desenho do seu futuro é multidimensional e depende tanto do seu plano individual de vida, como do contexto dinâmico da família e das perspectivas gerais do atual negócio como parte do setor mais forte da economia brasileira: o agro.
Segundo Vila, quando se fala em sucessão, é imprescindível considerar a transformação da pecuária tradicional em um novo modelo de negócio de empresa rural, com permanente inovação tecnológica. E essa nova perspectiva abre espaço para uma maior participação das herdeiras mulheres.
“Enquanto no passado a dominância de gestores masculinos era justificada pela robustez do trabalho no campo, a crescente automatização de todas as funções joga em favor de uma maior participação de filhas como gestoras competentes. A mudança da cultura do mandar para a cultura do seduzir favorece o perfil feminino. No futuro, cada vez menos pessoas (tanto produtores como trabalhadores) produzirão cada vez mais e melhor carne com cada vez menos terra e cada vez mais inteligência gerencial”, ressalta.
Dessa forma, prossegue Vila, o negócio da pecuária 4.0 (denominação da bovinocultura de precisão que trabalha mais com aplicativos do que com força física) cria novas regras para a empresa rural competitiva. E, em um cenário extremamente exigente, a união entre a família é a fortaleza para enfrentar a competição do mercado.
Ao invés de competir, para Francisco Vila, a receita é juntar a tradição e a vivência dos pais à inovação trazida pelos filhos, integrando esses “dois mundos” para crescer. “A chamada cogestão entre a experiência e a sabedoria da geração dos patriarcas e a habilidade técnica da geração dos sucessores precisa encontrar um equilíbrio de ação e de respeito mútuo, que levará a atual fazenda para dentro do grupo dos vencedores, que perpetuarão o legado dos fundadores em um ambiente totalmente diferente da realidade dos seus pais e avós”, arremata.
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